A Teoria U foi criada pelo alemão Otto Scharmer com base em 10 anos de extensa pesquisa e experiências vivenciadas em sua jornada profissional, é reconhecida como a décima quarta teoria da escola pós-moderna de administração de empresas. Considerando o contexto global turbulento, complexo, incerto e em rápida mudança, Otto traz uma abordagem instigante a respeito de como podemos ajustar nossa percepção e mundo interno e liderar a partir do futuro que quer emergir.
A partir de um olhar inovador e uma abordagem profunda, Otto nos estimula a repensar modelos de gestão que enfocam no passado ou que acreditam que a solução está na forma, na estrutura com que conduzimos pessoas e processos. É enfático em dizer que uma organização ou uma pessoa só podem acessar a possibilidade de cura (melhoria, evolução, avanço), quando ela mesma deseja se observar com cuidado e curiosidade para se auto conhecer – em seus pontos fortes e fracos. Somente a partir desse estado interno de qualidade é possível promover intervenções que se adequam às reais necessidades e que podem elevar o potencial de vida e de resultados.
“A qualidade interna do interventor é proporcional à qualidade da intervenção”.
Ele apresenta uma jornada em formato de “U” para que possamos acessar este estado interno de qualidade, que seriam:
1. Mente aberta (entrada do U): um estado de presença que considera aspectos mentais, cognitivos e racionais. Eu sou capaz de entender conceitos, fazer conexões entre eles.
2. Coração aberto (meio do U): um estado de presença em que além de considerar aspectos mentais, avanço no nível de sentimentos e emoções. Sou capaz de observar como eu me sinto ao compreender determinados contextos, quais emoções surgem quando analiso (mente) um problema ou proponho soluções.
3. Vontade aberta (fundo do U): um lugar interno que ele chama de presencing uma mistura do conceito de sentir e de presença, em que estamos absolutamente conectados conosco e com aquilo que desejamos construir e expressar. Sou capaz de criar a partir do futuro, pois estou completamente conectado com a ideia, com os sentimentos, comigo e com o propósito.
Entendendo que quanto mais conseguirmos sustentar um lugar de origem das nossas ações a partir do fundo do U, melhores serão nossas ações individual e coletivamente. Algo curioso a se observar nestas três disposições do processo é que quando vivenciamos situações, problemas, programas a partir da mente aberta a parte do corpo mais utilizada é a cabeça. Quando conseguimos avançar para coração aberto, o tórax e o peito são acionados. E quando conseguimos vivenciar de vontade aberta, todo o corpo participa desse processo. Isso nos instiga a pensar na importância que existe em estarmos conectados e percebermos todo o nosso corpo enquanto estamos trabalhando, resolvendo problemas, vivendo. Na maior parte do tempo usamos a cabeça, somos muito mentais e temos dificuldade de acessar, nominar sentimentos, emoções e questões mais internas.
O autoconhecimento é reconhecido pelas pessoas e pelas organizações como um processo importante e desejável há muito tempo. Disponibilizar-se para olhar para si mesmo, perceber sua maneira de pensar, poder identificar seus sentimentos e acolhê-los, estar consciente da sua forma de agir no mundo, parece ser uma das tarefas mais desafiadoras na imensa lista de experiências que temos na vida, tanto como indivíduos quanto como organização. E a teoria U, vem evidenciar que este processo de auto observação, auto consciência e autoconhecimento será um requisito indispensável nos ambientes de trabalho, uma necessidade a cada dia mais urgente.
E o que isso tudo tem a ver com segurança do trabalho? Tudo. Na mesma linha de entendimento, com base em anos de experiência nesta área de atuação, percebo que evoluir com os comportamentos e com a cultura de segurança nas organizações não se faz implantando um novo sistema de gestão, um programa da moda ou uma tendência de mercado. A mudança que as organizações querem ver acontecer no comportamento das pessoas, passa por esta jornada do “U” em que somos convocados a nos implicar na mudança de dentro para fora. Todas e cada uma das pessoas da organização precisam se dedicar neste sentido: em olhar-se, observar-se, admirar-se, acolher-se. Revisar as questões que importam de verdade para cada um e encontrar a conexão entre aquilo que importa ao indivíduo e ao coletivo ao mesmo tempo. E de que maneira podemos juntos encontrar respostas e soluções que atendam aos interesses e necessidades de todos, num processo ganha-ganha.
É extremamente desafiador não ter um sistema, uma teoria, uma estrutura, um programa, uma ferramenta ou outra pessoa para atribuir responsabilidades pelo que não está funcionando bem. É duro e difícil encontrar e admitir que as causas daquilo que não funciona no mundo externo reside no mundo interno. E talvez seja isso que nos impeça de avançar como seres humanos e consequentemente como sociedade. A teoria U é um caminho possível para este inevitável passo a que todos nós estamos sendo convocados neste tempo, que é o do autoconhecimento. Você está disposto?
Referência:
Scharmer, Otto C. Teoria U. Como liderar pela percepção e realização do futuro emergente. Rio de Janeiro: Elsevier, 2010